Quando olhamos à nossa volta, contemplamos muitas vezes uma humanidade marcada pela dor, pelo sofrimento. O sofrimento nos lança, muitas vezes, em postura de questionamento. Então nos perguntamos: Por que sofremos? Por que a dor? Por que a injustiça? Por que padecemos das mais variadas formas? Se Deus é o Sumo Bem, por que experimentamos em nossa carne humana a experiência da dor, da morte, da contingência, da limitação, da fraqueza e da impotência?
O homem, em sua condição existencial sofre, por meio do “sofrimento físico”, com aquela dor que atinge a sua realidade somática, biológica, ou seja, uma enfermidade, uma doença, algo que o faz experimentar sua contingência. Há outro aspecto de sofrimento que o homem também vivencia, que é o “sofrimento psicológico”; este é caracterizado por aquelas experiências que marcaram sua realidade psíquica, experiência dolorosa em relacionamentos que geraram traumas, complexos, carências, necessidades não supridas... Podemos ainda perceber outra dimensão do sofrimento para aqueles que vivem a fé cristã, que é o homem poder experienciar “o sofrimento moral’’. Este sofrimento é causado por aqueles que lutam constantemente para adequar sua vida comportamental ao projeto divino, revelado por Cristo nas Escrituras. O cristão passa a viver não mais movido pelas suas concupiscências, pelos seus impulsos carnais, mas pauta a sua vida na moral cristã, vivenciada de forma perfeita por Cristo e anunciada por ele e seus discípulos como caminho de salvação. Isto implica em uma morte para si, para suas tendências desordenadas; morte esta que tem como fim a vida verdadeira, a liberdade autêntica.
Umas das coisas que mais me impressionam em Jesus é Sua capacidade de se compadecer do sofrimento das pessoas. Ele olhava para cada pessoa em particular e vivia junto com ela os seus sofrimentos. Foi assim com cegos que Ele curou, com os coxos os quais encontrou, com os pecadores, tais como a Samaritana, o publicano Levi, a pecadora pega em situação de adultério, o publicano Zaqueu. Vemos nestes homens e mulheres sofredores, seja no seu físico, seja no seu psicológico, seja na dimensão moral, sendo de uma forma toda própria, recebendo em um momento específico de sua vida, na dor, a revelação preciosa de um Deus amante e presente em sua história. Uma dor experienciada que se transformou em glória manifestada.
Independentemente do que vivemos, Cristo sempre está unido a nós, pois Ele tem um olhar especial pelos que sofrem. É no sofrimento que mais nos parecemos com Ele. O Beato João Paulo II escreveu uma carta apostólica de belíssimo conteúdo no ano de 1984, chamada Salvifici Doloris. Esta carta, embora escrita haja alguns anos atrás, é de grande resposta ainda hoje para nós, pois nos aponta a maneira de lidar com nossos sofrimentos. Neste documento, ficam claras duas posturas que o homem pode ter diante do sofrimento: a busca do porquê e para quê do sofrimento.
Vivemos em um mundo que busca o prazer a qualquer custo, no qual a ideia de prazer é vinculada à felicidade. Por isso, falar de sofrimento é ir contra a correnteza. Acredita-se que somente seremos felizes se tivermos essa sensação de prazer em tudo o que fazemos. Dessa forma, o sofrimento virou sinônimo de infelicidade. Diante da dor, muitas vezes nos perdemos no “porquê”. Ele nem sempre nos dará a resposta, pois o sofrimento, em sua complexidade é um mistério que envolve o ser humano; mas a resposta, para nós que cremos estará no “para quê”. Este para quê, terá sentido pleno se unido ao mistério da Paixão do Senhor, que em Sua dor dignificou e redimiu o sofrimento trazendo sentido a ele.
O cristão é convidado a mostrar ao mundo um testemunho diferente. Mostrar que, se colocamos sentido e significado aos nossos sofrimentos, é possível encontrar a felicidade neles. Talvez o maior problema hoje seja este: as pessoas andam desperdiçando a sua dor. Mesmo aquele sofrimento, fruto de nossas escolhas erradas, se unidos ao Cristo, podem ganhar sentido, e tornar-se para nós um degrau que nos eleva a Deus, à santidade.
Se eu dou sentido ao sofrimento que vivo, santifico-me. Você é quem escolhe o sentido que você vai dar à dor na sua vida. Quantas pessoas, com doenças graves, encontraram sentido para suas vidas a partir do momento em que começaram a ajudar outras pessoas com o mesmo problema. Muitas pessoas tornam a própria vida um fardo sem fim, pois não conseguem dar sentido às dores vivenciadas, lamentando-se eternamente, escravas de suas dores. Cativas das próprias feridas.
O que tornou tantos homens e mulheres santos na história não foi o sofrimento que viveram, mas o sentido que eles deram a ele. Aprenderam a não desperdiçar esses momentos aproximando-se de Deus e dos outros por meio dele.
É preciso que aprendamos a sofrer. É preciso dar sentido às nossas angústias. Uma mulher que vai dar à luz sofre, mas ela não pensa nas suas dores, ela só pensa no filho que carregará nos braços e verá crescer. A mãe entende que a alegria que virá depois será muito maior que o sofrimento vivido. São Francisco de Assis já dizia: “É tão grande o bem que espero, que todo o sofrimento me é um grande prazer”.
“Demos graças ao Senhor nosso Deus, que nos submete a provações, como fez com nossos pais. Lembrai-vos de tudo o que Deus fez a Abraão, de como provou Isaac, de tudo o que aconteceu a Jacó. Assim como provou pelo fogo, para lhes experimentar o coração, assim também Ele não se está vingando de nós. É antes para advertência que o Senhor açoita os que dele se aproximam” (Jt 8,25-26 a.27).
Não há sofrimento grande ou pequeno. Qualquer momento de dor é capaz de levar à santidade e lançar ao céu. Assim, é preciso que cada um de nós aprenda a viver intensamente as visitas de Deus nesses momentos. A escolha é de cada um: sofrer por sofrer ou sofrer com sentido, mesmo nos momentos de angústia. Use do seu sofrimento para ir além de suas limitações, para ir além do que você se vê capaz de fazer ou viver.
Se você não desperdiçá-lo, surgirá um sorriso em seus lábios capaz de ressuscitar a muitos que estavam a ponto de morrer. Isso é santidade. Não desperdice o seu sofrimento! “Nós sabemos que Deus coopera em tudo para o bem daqueles que o amam, daqueles que são chamados segundo o seu desígnio” (Rm 8,28).
Texto feito por Padre João Evangelista, sjs - Sacerdote Salvista
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